15 de jan. de 2015

para a pessoa que eu costumava ser

Oi, moça. Sente orgulho de mim? Direta, assim mesmo, do jeito que você não gosta. Olha pra mim agora, tu bem sabe o que passamos. Olha bem nesses meus olhos, teus olhos, refletidos nesse espelho. Encara o cabelo que tu deixou crescer, encara as olheiras de choro, encara tuas marcas adolescentes que estão indo embora conforme eu cresço e o mundo bate na minha, na nossa cara. Encara minhas mãos, menina. Sente desprezo por elas? Por quem bateram, pelas lágrimas que limparam, pelos corpos que acariciaram? Repudia nossa boca, menina, pelos lábios que beijamos, pelas vidas que deixamos de tirar?

Sente orgulho de mim?

Passei tanto tempo querendo te esquecer. Tentando superar você. Mas você me segue, cara, pesando meu coração, pedindo por aventuras e por emoções como uma maldita criança mimada. Você, sua fraca, carente de merda, nunca me deixou; mesmo quando te implorei para ir embora. “Vai, por favor”, eu suplicava. “Não exija tanto de mim.”

Sente orgulho de mim, criança? Sente orgulho dos sentimentos que você me ensinou a esconder? Das verdades que me instigou a encobrir? Dos rancores que me obrigou a guardar?

Você costumava escrever que queria viver. Implorava isso a mim. Implorava isso ao mundo. Quer saber de uma coisa?, estou vivendo agora. E ao mesmo tempo, não estou. Você sabe o que isso significa?

Olha pra mim. Olha pra nós, que a gente não vive; o tempo só passa e temos que aprender a lidar com esse tique-taque impiedoso. Você, menina, foi pura de coração – e hoje não somos mais. Corrompidas, machucadas, bagunçadas e confusas. Você, pelo menos, exibia-se ou encontrava uma maneira de te liberar.

Eu não tenho mais nada, moça. 

Sente orgulho de mim?

Se não, me deixa. Por favor, me deixa. Já é difícil o suficiente seguir sem o peso dos seus sonhos inconsequentes. Já é difícil o suficiente não voltar atrás quando não te tenho sob minhas costas.

Sente orgulho de mim? 

Tua opinião importa. Então, dê-a e vá. Me livre de ti.

Me livre de mim mesma.